Para matéria de capa da semana passada, a revista Veja elegeu o assunto "Como manter um casamento". Esta semana, o tema foi o sucesso da classe média negra brasileira. Eu acho estranho que a conversa em tudo que é canto seja sobre a crise política e econômica do governo e que isso não seja escolhido para capa das publicações mais populares do país. Estranho é modo de dizer. Veja, por exemplo, é uma formadora de opinião importante no nível nacional e é alinhada com o empresariado paulista. Assim, não vai ser ela que vai colocar lenha na fogueira do descontrole que o governo FHC vem apresentando nas últimas semanas.

O quadro é preocupante. O PFL, depois de ajudar a colocar FHC no governo por mais um mandato, não tem mais motivo para dar suporte ao PSDB. Partiu para fazer oposição ao presidente. ACM, com sua regular competência, pode bater como quiser no governo, por que Fernando Henrique não tem opção senão ficar boiando com o pouco de apoio que o PFL lhe dá. Ao PFL caberá apenas ir cobrando cada vez mais de FHC. Se ele cede: bom para o PFL. Se não cede, ACM bate mais, enfraquece Fernando Henrique ainda mais e coloca o PFL em melhores condições para negociar a troca de favores com o governo.

Enquanto isso, o tempo passa e os problemas do país vão se avolumando. O desemprego continua alto. A reforma fiscal não acontece. A dívida interna e externa crescem sem controle. É senso comum entre os economistas que o governo vai ter que dar um calote. Só não se sabe quando. Mas os meios de comunicação não querem saber de falar sobre isso. Eu também acho isso razoável. Já imaginaram se a imprensa começa a dizer que a situação está insustentável e o governo vai decretar algum tipo de moratória. Ia ser mesmo um caos!

Mas, o que fazer? Parece que não há solução. Vejam só. O povo, na grande maioria, não tem educação, habitação ou saúde. Mal consegue tocar a vida, quanto mais entender a zona que o país está. A elite deslumbra-se com os prazeres da riqueza, como os índios se impressionaram com os espelhos dos colonizadores. Por um celular ou uma Pajero, aceitam qualquer coisa para o país e seu futuro. O Poder Legislativo, tem pelo menos 50% totalmente comprometido com o poder econômico tradicional brasileiro. A estes, não interessa mudar nada, o esforço é para manter em suas mãos o poder que detêm ao longo de décadas. O voto, que poderia mudar o quadro viciado do Legislativo, a cada dia que passa é mais sujeito à manipulação via o controle de informação na mídia e a propaganda maciça nas campanhas eleitorais. O Judiciário é burocracia inócua. Sua corrupção está aparecendo. Mas, no meio desse tumulto, é de menor importância. A justiça precisaria de mudanças. Mas, para isso, precisaríamos do Legislativo. Ou seja, não vai ser por aí.

Faltou um: o Poder Executivo. Este, no nosso regime político, deveria ser o encarregado de dar uma direção a este Brasil desgovernado. Mas, precisaríamos de um presidente que tivesse culhões. Algo com aquilo que o finado presidente Collor disse que tinha para vender imagem de macho. Sim, precisaríamos de um presidente com "aquilo roxo". É aí que percebemos a enrascada em que estamos. FHC não tem esta pretensão. Seu estilo é o de tocar as coisas comodamente. Sem maiores constrangimentos políticos. Se alinhando a quem tiver força. Curtindo uma imagem de estadista. Viajando pelo mundo. Gastando seu francês. Se ele fosse presidente dos EUA, ia fazer melhor papel que o Clinton. Pelo menos FHC não parece ser do tipo que ia atacar a estagiária. Mas, os brasileiros precisam de algo mais. Precisa-se de um presidente que se oponha às forças que estão arrastando o Brasil pro buraco. Um presidente que reverta a proteção a grupos econômicos. Que consiga separar o que é interessante na globalização do que é apenas entrega de ativos nacionais ao capital estrangeiro. Um presidente que corra o risco pessoal de tomar decisões. Eu acho que esse não é ocaso do FHC. Pelo que vimos até agora seu saco não é roxo! O do ACM é. Mas, apesar dele até ter reparado recentemente que existe a pobreza, não acredito que vá usar sua força pro bem.

- Tirésias da Silva -

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05agosto1999
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