IN VINO VERITAS

Percival Puggina (www.puggina.org)
colaborador

O jantar de comemoração proporcionado por Duda Mendonça ao mais disciplinado de seus clientes (depois de Celso Pitta, claro), no qual Lula degustou, a título de presente, uma garrafa de Romanée-Conti avaliada em seis mil reais, me trouxe à mente a expressão latina: "No vinho, a verdade".

Nunca me pareceu convincente o discurso que procura escriturar, como bem das esquerdas, a sensibilidade para com as carências alheias, a austeridade e a justiça social. Um mínimo conhecimento de História mostra o elevado padrão de vida que a nomenklatura dos países do Leste Europeu se atribuía, em total discordância com a escassez imposta ao restante da população. Quem vai a Cuba logo ouve falar dos que "tienem la heladera rellena", ou seja, dos que gozam os privilégios de consumo concedidos à alta burocracia partidária, longe das restrições determinadas pela libreta.

Com isso não quero dizer que não existam, na esquerda, pessoas sinceramente preocupadas com questões sociais e que vivam segundo os valores que proclamam em seu discurso. Mas recuso totalmente a tese de que esses mesmos valores não sejam igualmente assumidos e praticados por pessoas de outras correntes ideológicas, ou mesmo sem ideologia alguma. Por outro lado, os conceitos socialistas fundamentais (estatismo, luta de classes, negação da propriedade privada, planificação econômica) jamais produziram democracia e prosperidade.

Você pode ter certeza disto: nenhum desses radicais que andam por aí fazendo discurso contra a liberdade de mercado e contra as empresas privadas, sonha com implantar suas idéias para ir trabalhar no chão de alguma fábrica. Nem pensar! O que eles querem é ganhar de presente (ou na marra) a poltrona, o tapete e a adega do diretor.

"Quer dizer que o Lula não pode beber Romanée-Conti?", haverá de indagar o leitor afeiçoado ao nosso Tony Blair de Garanhuns. Pode, mas não deve. Ostentação e hábitos de milionário são práticas incompatíveis com a vida pública, principalmente quando assumidas por quem se apresenta ao povo como o único defensor dos humildes. Diante disso, fica-se pensando nas palavras de Fidel Castro (outro que vive aos rega-bofes) durante a instalação do Foro de São Paulo, quando disse que o Foro se instalava para "reconquistar na América Latina o que foi perdido no Leste Europeu". Estaria ele se referindo aos luxos da burocracia?

Aviso aos candidatos: evitem o vinho. Retirada a rolha, ele trás à tona verdades inconfessáveis.

Percival Puggina é arquiteto, político, escritor e presidente da Fundação Tarso Dutra de Estudos Políticos e Administração Pública.


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14outubro2002
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