INCLUSÃO SOCIAL - A QUESTÃO É: COMO?

Lucila Brito
colaboradora

Desde da campanha presidencial, a adoção de políticas de ação afirmativa saiu do círculo legislativo e virou assunto corriqueiro em qualquer bar, supermercado, igreja, universidade ou repartição do país. Entretanto, o entendimento da real finalidade de uma política de ação afirmativa requer a apresentação de alguns conceitos.

Pode-se denominar ação afirmativa qualquer política que vise compensar grupos que tenham sido alvo da exclusão ou abuso social. Portanto, negros, mulheres ou operários de fábricas podem estar inseridos nessa designação. De modo que, a luta e a obtenção de direitos civis são válidas a qualquer grupo que se faça representar.

Um segundo ponto é que a ação afirmativa já subscreve a existência de racismo, sexismo, xenofobismo e manifestações de intolerância afins, que empecem determinado grupo de usufruir oportunidades livres aos demais membros da sociedade. Ou seja, políticas dessa ordem já subentendem a existência de uma intransigência social específica. E não pretendem combate-la. Seu objetivo imediato é coibir seus efeitos, como a dificuldade de acesso ao emprego e à educação e/ou de ascensão social (característica primordial de qualquer país que, como o Brasil, adote um sistema capitalista de governo). Desse modo, a erradicação da intolerância seria uma etapa posterior a disponibilização de oportunidades aos diversos setores sociais. E englobaria não só uma discussão legislativa, como também questionamentos filosóficos, evolutivos e éticos, muito além da realidade atual do Brasil.

Isso porque a adoção de políticas afirmativas tem sido discutida, principalmente, em relação à população negra do país. O que esbarra numa idiossincrasia brasileira: a não-admissão da intolerância racial. Os críticos vêem com ressalva discussões e ações nesse sentido porque temem, principalmente, a institucionalização do racismo e o estabelecimento de uma tensão racial que culmine em reações violentas pelo Brasil a fora. Em outra linha, há os que criticam com base na defesa dos direitos da propriedade privada e de livre competição. Em meio às argumentações ideológicas que indagam o porquê da adoção de políticas dessa natureza no país, perde-se o foco de uma questão principal.

No Brasil, existe uma parcela da população de excluídos que, segundo dados estatísticos confiáveis, tem como maioria um grupo específico: descendentes de escravos africanos que foram libertos sem que nenhuma condição de sobrevivência lhes fosse garantida. Sob uma realidade tão degradante, pouquíssimos indivíduos teriam condições de progredir. A conseqüência evidente disso foi a marginalização massifica de negros e mulatos. Negar ou esquecer esse fato é impossível. Ignora-lo, portanto, beira a criminalidade.

É função de qualquer Estado, sob qualquer forma de governo, garantir, senão recursos, ao menos oportunidades, aos cidadãos. A pergunta, portanto, é: é admissível que uma parcela considerável da população de um país viva longe da vida acadêmica e em condições de pobreza? E, sabendo-se as causas primárias dessa exclusão, é direito não tentar remedia-la?

Quando se ouvem as mais variadas argumentações para que direitos não sejam fornecidos, é pertinente pensar se não se está diante de uma real preocupação social, e sim da defesa da manutenção do orgulho de sermos uma democracia racial, desde de que isso não altere o padrão das coisas.

A adoção de cotas na universidade não é criteriosa? A reserva de vagas para mulheres em cargos públicos é protecionismo? Essas são questões secundárias quando se enfoca as condições subumanas (ou, no mínimo, injustas) em que grandes parcelas de membros de determinados grupos vivem no país. E esperar que o poder público cruze os braços frente a essa realidade em prol de uma pretensa igualdade de raças (baseada, dentre outros absurdos e concessões, numa miscigenação nascida, em grande parte, do abuso sexual) é institucionalização do atraso social, que tem como conseqüências os atrasos político e econômico.

Não se trata, portanto, de admitir ou não a existência de racismo no Brasil. Trata-se de algo maior: a garantia da cidadania a qualquer indivíduo nascido no país. Numa discussão como essa os únicos questionamentos pertinentes deveriam enfocar como fazer. E não o porquê. O porquê é óbvio. Vergonhosamente óbvio.

Outras opiniões/constatações:

http://oindividuo.com/convidado/tostes8.htm

http://www.intelecto.net/cidadania/nada.htm

http://www.planalto.gov.br/publi_04/COLECAO/RACIAL.HTM

www.espacoacademico.com.br/22colab.htm


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20março2003
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