Ghost Dog

Um caso famoso no cinema é a história do diretor estreante que faz um filme baratíssimo e se torna sucesso de público e crítica. O diretor Jim Jarmusch foi um precursor desse fenômeno. Seu filme de estréia, Strange Than Paradise (1984), foi realizado com US$ 2.000, atores amigos, uma câmera, uma lente grande angular e sobras de filme preto-e-branco de outra produção. Foi um sucesso. Era um curta-metragem, mas o estúdio convenceu Jarmusch a esticar um pouco a história para lançá-lo no circuito comercial. Tornou-se um mito. Um virtuose que desafiou os ditames dos grandes estúdios? Não tanto! Na verdade, uma simbiose entre o diretor novato que quer entrar no negócio e os estúdios que encontram mais uma oportunidade para faturar. Outros gênios do cinema tipo pouca-grana-na-mão-e-competência-na-cabeça vieram depois. O mexicano Robert Rodriguez fez El Mariacchi, que só custou US$ 7.000. Mais recentemente, sofremos a impostura das Bruxas de Blair. Ou seja: o golpe está virando de rotina.

Jim Jarmusch apareceu como o garoto genial e não sustentou a fama. Fez um bom Daunbailó (Down By Law) e, de interessante, ficou por aí. Desapareceu por sete anos e agora retorna com a comédia Ghost Dog. O filme conta a saga do herói solitário. A figura do assassino profissional não é rara nas telas. Charles Bronson, antes de enveredar de vez no infindável seriado Desejo de Matar, fez boa figura de matador frio e calculista em The Mechanic (1972). Em Nikita, Luc Besson desenhou o personagem do assassino profissional, "the cleaner", que acabou por render um filme: O Profissional (Léon). As produções americanas Assassinos e o O Especialista, estreladas por Sylvester Stallone, pasteurizaram o tema. Também, o que vocês esperavam de Rambo? Sutileza? Bem, em Ghost Dog, Jarmusch escreveu e dirigiu uma saga de samurai moderno e consegue resgatar este filão cinematográfico.

Forest Whitaker encarna um belo samurai negro. Ele consegue parecer ágil como um ninja. Com diálogos interessantes, Ghost Dog nos apresenta o negão que vive de cumprir seus "contratos". A descrição cínica dos personagens nos lembra, a todo instante, que se trata de uma comédia. Mas a figura do samurai é respeitada. Não será surpresa se um rapaz de cabeça vazia se apaixonar pelo samurai de Jarmusch e suas filosofias. E tentar colocá-las em prática.

O filme tem o mérito em apresentar ritmo lento para uma história que costumam contar em seqüências rápidas e correrias. Jarmusch preferiu encenar um balé ao ritmo de rap. O mestre Kurosawa é lembrado na grande referência a Rashomon, de 1950. Quer ver, por exemplo, onde Whitaker aprendeu a embainhar uma espada? Reveja Os Sete Samurais. As referências se sucedem. Uma jovem parece a Uma Thurman de Pulp Fiction. A menina que se torna amiga do Ghost Dog nos recorda Mathilda, a criança amiga de Léon em O Profissional.

Ghost Dog é cheio de elementos para colocá-lo entre os bons lançamentos de 2000. A idéia do vendedor de sorvetes que só fala francês e seu entrosamento com o samurai é inesquecível. O deboche dos mafiosos é humor especial. Os planos da cidade decadente, feitos no estilo desenvolvido em Daunbailó, retocam o clima da história. Ghost Dog é bom filme e mostra que Jarmusch continua um bom vassalo do cinema.

Quiz: Com que nome o filme The Mechanic passou no Brasil? De que filme sobrou a película em preto-e-branco que foi usada em Strange Than Paradise? Quem souber, por favor nos escreva contando.

cotação:

- Ernesto Friedman -

 
 

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30janeiro2000
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