Inteligência Artificial 
Artificial Intelligence

Qualidade Artificial

Silvio Santos atrapalhou os negócios de Steven Spielberg. Como de praxe, na semana passada, a capa da Veja deveria trazer a chamada para seu novo megafilme Inteligência Artificial (IA), que estréia no Rio no final dessa semana. Mas a filha de Silvio Santos foi seqüestrada por um maluco, que realizou algumas proezas verdadeiramente cinematográficas, culminando com o retorno ao local do crime em busca de garantias para não ser morto pela polícia. Bom roteiro! O final do seqüestro teve Silvio e o governador de São Paulo caminhando lado a lado, o início de uma grande amizade, como em Casablanca. Com isso, o filme saiu da capa, mas Spielberg ganhou matéria de seis páginas.

O nome causa impacto: Inteligência Artificial. Entretanto, é inadequado. O filme trata de emoções artificiais e não da tal inteligência. Afinal, a inteligência é mais fácil de simular que o amor. Ou não?  Mas, para vender o filme, a marca IA é melhor mesmo, então, Spielberg usou.

IA é um filme de Spielberg com fortes traços de Kubrick. Dessa vez, o diretor de Tubarão desenvolveu projeto conjunto com o falecido Stanley Kubrick, fazendo uma ficção científica com ambições psicológicas. É um pinóquio moderno. Ficou um filme que se pretende seríssimo, mas não me convenceu. IA tem o ritmo lento de Kubrick. Vale o elogio a Spielberg por mimetizar o estilo do mestre! A fotografia é bem desenhada e os efeitos são de primeira ordem. Também, este tipo de coisa não está mais impressionando. Coloca-se qualquer fantasia no celulóide. Só por enquanto. Daqui a pouco vai ser tudo digitalizado mesmo.

IA é a história da versão beta do boneco com emoções, que quer ser gente. Para tanto, o pobre robozinho, interpretado por Haley Joel Osment (Sexto Sentido), vai sofrer todo tipo de infortúnio, de modo a sensibilizar os corações maternos (e paternos) mal resolvidos que freqüentarem as salas escuras. Ele curte até uma de Jesus Cristo naquela cena do "atire a primeira pedra". Um pouco pesado! O roteiro parece ter saído das mãos competentes de Paulo Coelho. A visão do mundo adulto por parte da criança já tinha sido mostrada por Spielberg em E.T.. Agora, a criança carente é tripudiada. A caminhada de sofrimentos do menino-robô David lembra Laranja Mecânica. Infelizmente, a beleza do teorema sobre a violência, que Kubrick desenvolve em Laranja, não se repete em IA. Spielberg faz um filme com sua veia piegas e sentimentalista que tanto atrai multidões. E ele abusa de citações. O cientista que desenvolve a criatura e vive num mundo inundado e noir lembra Blade Runner. As pessoas vazias lembram os homens assépticos e embotados de sentimentos de 2001, Uma Odisséia no Espaço. Os seres superevoluídos que vêm pesquisar a humanidade - esta devidamente extinta - é como um Encontro do Terceiro Grau retardado. De referência em referência a outros filmes de Kubrick e Spielberg, o amor do pequeno andróide carente não me tocou tanto assim. Acho que me falta algum trauma de criança (parece que a infância de Spielberg foi recheada deles) para criar uma relação mais forte entre mim e o pequeno David. Vocês vejam e decidam. Cabe a cada um conferir suas patologias infantis mal resolvidas. Entretanto, caro leitor, se chorar no filme, recomendo buscar tratamento.

cotação:    

- Ernesto Friedman - 


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06setembro2001
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