O Príncipe

O tempo é cruel

Gosto muito de 2 filmes do cineasta paulistano Ugo Giorgetti. Um deles é Festa, de 1988, em que praticamente toda a trama se passa no subsolo de uma mansão paulistana. São 3 personagens contratados para animar uma festa e ficam a espera de serem chamados, o que nunca ocorre. Durante os longos minutos de exibição, Antônio Abujamra, Adriano Stuart e Jorge Mautner desfilam, com muita qualidade, toda uma sorte de angústias a que o ser humano está exposto. Embora seja lento e linear, o filme é de uma beleza triste, de um lirismo espontâneo. Apesar de se passar num único cômodo, o filme nos permite passear por uma São Paulo conhecida dos paulistanos e que muitas vezes tentamos não enxergar. É o submundo da cidade. Aliás, dissecar a cidade de São Paulo é a especialidade desse cineasta e isso pode ser melhor percebido em seu filme Sábado, de 1994. Muito menos denso e mais leve, esse filme consegue provocar gargalhadas até, ao mesmo tempo em que expõe a mesma angústia do filme anterior. Novamente, é no trabalho com os atores que Giorgetti extrai o melhor do filme. As atuações de Otávio Augusto, André Abujamra e Maria Padilha são impecáveis. As participações de Décio Pignatari e Jô Soares são estupendas. Enfim, dois filmes imperdíveis.

Depois desses, fez Boleiros, em 1997 que, embora interessante, não tem a mesma graça e nem a mesma densidade, mas agora, Ugo Giorgetti errou a mão de vez, com seu novo filme, O Príncipe. O maior defeito, parece ter sido a escolha dos atores, tanto os principais quanto os coadjuvantes. Eduardo Tornaghi, depois de tanto tempo sumido, renasce das cinzas e só não se pode dizer que está pior, porque isso não seria possível. Ewerton de Castro é daqueles atores de um personagem só e nunca conseguiu repetir nos palcos ou em qualquer tipo de tela, sua performance no teatro com "O homem elefante". Bruna Lombardi é uma mulher muito insistente. Insiste em se manter linda e insiste em ser atriz. Num caso consegue, noutro não. Sobre Ricardo Blatt é melhor não falar nada, pois a quantidade de adjetivos necessários para qualificar sua atuação poderia provocar náusea. Até mesmo Otávio Augusto, esse sim, um bom ator, parece pouco à vontade no filme. Dos atores coadjuvantes, então, não há nada que se possa falar. Chega a ser constrangedor ver suas interpretações primárias.

O enredo do filme poderia ser interessante, caso não fosse tratado de maneira tão ingênua. É absolutamente inadmissível que um homem, quarentão, volte ao Brasil, depois de ter ficado 20 anos em Paris e se surpreenda tanto com o que encontra em São Paulo. Como se Paris não fosse também uma grande cidade e não tivesse também, talvez em menor proporção, os problemas estruturais e sociais de toda metrópole. Não digo que se goste da cidade reencontrada, mas nada justifica o ar embasbacado do personagem principal frente a cada situação com que se depara (ou será que esse ar embasbacado é do ator?).

Georgetti tenta falar sobre o tempo e o efeito que ele provoca nas cidades e nas pessoas. Aproveita para criticar todo e qualquer comportamento com que ele não concorde, mas o faz de uma maneira pobre. Os comportamentos e as situações são realmente criticáveis mas ao fazê-lo, de forma tão pouco criativa, acaba esvaziando a força da crítica em si.

O tempo é inflexível e cruel. As coisas mudam e as pessoas mudam também. E quase todas melhoram em alguns aspectos e pioram em outros. Só duas coisas não mudam. As idéias e conceitos de Gustavo, o personagem principal do filme, e a beleza de Bruna Lombardi. Com ela, o tempo não foi cruel.

cotação:    

- Arnaldo Heredia -
colaborador
 


envie este artigo a um amigo

envie agora seu comentário sobre este artigo 

mais cinema

início da página | homepage Polemikos

29outubro2002
Copyright © [Polemikos]. Todos os direitos reservados