piauí_a revista de joão moreira salles

- tirésias da silva -

Chegou a piauí - que seja em minúscula para dar um tom de intimidade - a revista do João Moreira Salles e outros. João é filho do Walther Moreira Salles, falecido dono do Unibanco, e irmão do cineasta Walter Salles Júnior. Nada como uma elite esclarecida. João não fica por aí gastando a grana da família e comendo as manequins da moda (seria pleonasmo?). Depois de fazer documentários, decidiu por um projeto de revista. Pois é, o dinheiro liberta. Para quem o tem, óbvio. A revista piauí saiu boa. Me lembra o pré-histórico jornal Opinião, com poucas fotos, muitos desenhos e artigos longos. É para quem gosta de ler. Traz matérias atuais mas que não perdem o interesse numa semana. Dá para encontrá-la no sofá daqui a um mês e tudo nela será legível. A produção gráfica é austera, mas o resultado agrada. As publicidades parecem coloridas demais para o tom sóbrio dos artigos, mas eles pagaram pela página, têm o direito de colorir como quiserem. Grandes contas publicitárias anunciam no primeiro número. Encontramos pesos pesados dos principais segmentos de negócios, tais como Itaú, Telemar e Volkswagen. A curiosidade fica por conta do anúncio da Revista Seleções de Reader’s Digest, tendo Washington Olivetto como garoto propaganda. O mundo dá voltas, não? Mas, não nos distraiamos, piauí quer ser refinada. O ensaio fotográfico no final da revista define a sofisticação. É em preto-e-branco, naturalmente.

Os artigos são bons de ler. Faltava algo desse tipo no cenário editorial brasileiro, com textos longos, sem se limitar aos tamanhos e apelos de momento das revistas semanais. Para complementar o modelo, tem quadrinhos e um horóscopo (?) intelectualmente correto. O artigo sobre o telemarketing é atraente, transitando entre o trágico e o risível. Um perfil do parnasiano Roberto Jefferson mostra mais uma faceta desse estranho personagem. Ivan Lessa retorna ao Rio depois de 30 anos e comenta a cidade (mais Ipanema) com natural saudosismo. Qual livraria ele se refere? A Travessa? De quem é o apartamento do amigo, na Vieira Souto? De Diogo Mainardi? O conto do Rubem Fonseca é fraco. O texto é bom, mas a idéia é rala. Piauí - bem, agora foi no início da frase, tinha que ser com maiúscula – mostra palavras arrumadas. É para o prazer e ritual da leitura. Como objeto, piauí também serve, nestes tempos de ícones, para ser exibida em cafés e emprestar um ar intelectual ao portador.

A peculiaridade da publicação fica com os articulistas convidados. Há uma consistente contratação de pessoal na faixa dos setenta anos de idade. E não são poucos. Do recém retornado Ivan Lessa, a lista se estende por Rubem Fonseca, Danuza Leão e o desenhista Jaguar. Não devem ter colocado Millor para não ficar muito na cara. Vamos ver o próximo número. Outro também não tão jovem é o sempre bom Roberto Pompeu de Toledo, que estamos acostumados a ver na última página de Veja. O autor do desenho da capa é mais um clássico: Angeli. É assim mesmo, se não temos melhores entre os jovens, por que não manter a velha turma na linha de frente?



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15outubro2006
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