O Paradoxo do Trubufu

Segue-se a gentil consulta de nossa leitora Laura Trajano, que se intitula "a estudiosa". Logo abaixo, a resposta do afoito Severino. Para seu deleite...


Sr. Severino,

.. vou me arriscar a provocá-lo, não exatamente com um problema mas com uma indagação que o Sr., com sua sabedoria e experiência, talvez possa explicar.

Trata-se de uma observação sobre os homens, ou melhor, sobre uma certa categoria de homens.

São homens mentalmente e fisicamente razoáveis, capazes portanto de atrair mulheres bonitas e interessantes. São bastante racionais, sem qualquer romantismo. Demonstram ser extremamente observadores, críticos e exigentes em relação ao físico das mulheres: uma toda malhadinha está muito musculosa, outra é magra mas flácida, esta tem muito peito, aquela mulher tesuda, cobiçada por muitos homens brasileiros, ah, é gorda e tem muita bunda, aquela outra já está passadinha, veja o cabelo desgrenhado desta, a outra ali precisa perder uns centímetros na barriga, e o pernão daquela lá ... Raramente há algum espécime do sexo feminino que passe incólume pelo seu teste. E ai de uma mulher que os escute, há de se sentir derrubadinha!

Pois bem, fico sempre imaginando como seriam as namoradas e/ou mulheres destes homens. Imagino cada mulherão! Mas tenho tido algumas surpresas!

Um exemplo é o de um amigo meu que, quando solteiro, vivia pulando de galho em galho! Quando finalmente se aquietou foi com um "trubufu"! Pode lá ser que a fulana seja muito legal mas que era indiscutivelmente um "trubufu", ah isto era ("trubufu" por unanimidade e, esclareço que a denominação "trubufu" não é originalmente minha)! Deixo bem claro que acho o conteúdo mais importante que o físico, não tenho nada contra "trubufus", minha estranheza é a combinação "trubufus" com homens desta categoria!

E, como este exemplo, tenho observado outros casos. Há casos de "trubufus" de nascença, de "trubufus" cultivados e outros, não necessariamente de "trubufus", mas de mulheres fisicamente muito abaixo do padrão elogiado e admirado por estes homens.

Já pensei em algumas razões que não quero colocar aqui para não influenciá-lo. Certamente, o Sr. há de ter uma explicação para dar. Isto, é claro, se a minha carta for selecionada. De qualquer modo, obrigada!

Laura Trajano (13/10/1999)


Minha Cara Laura

Reconheço que fiquei vivamente impressionado com sua missiva. A senhora (me permita o tratamento formal) tocou um tema que também me chama atenção e que carece de ser compartilhado com o fogoso grupo de moças que nos lêem.

Entendo que o aparente paradoxo que a senhora descreve é o fato de homens sadios apresentarem um discurso voltado para o culto à beleza física, enquanto, na sua prática vivente, exibem a companhia de mulheres não tão prendadas nesse quesito. Entendi bem?

Pois é, perscrutante Laura (vou abandonar a formalidade maior pois a essa altura já estamos mais íntimos), como referi lá atrás, tudo não passa de uma falsa contradição. Se olharmos com mais vagar e atenção podemos reparar que a postura masculina continua justa e reta, resistente a críticas, mesmo aquelas bem intencionadas como, sem dúvida, foi o seu caso.

Sem mais delongas, a pequena confusão se deve à combinação de duas belíssimas qualidades exibidas pelo macho de nossa espécie, quais sejam: por um lado, o homem tem um apurado senso estético que transforma cada um de nós em um exegeta da beleza do sexo oposto. Esta virtude superdesenvolvida acaba por ser exercitada freqüentemente e se traduz em comentários e avaliações que só têm por objetivo aprimorar o processo de constante observação e medição lançado sobre o altar do corpo feminino. Por outro lado, o que talvez tenha trazido algum desconforto à senhora (voltei à formalidade), é que o homem, na sua generosidade transbordante, na sua incontinente beleza interior, é uma criatura voltada para o amor. A exacerbação do nosso romantismo, da sensibilidade, faz com que a paixão seja cega à beleza física. Assim, o homem, frente ao seu objeto de culto, a mulher, não se deixa levar por detalhes curvilíneos, rugas, estrias ou outros elementos plásticos sobre os quais tem total domínio crítico. Ele se entrega magnífico ao delicioso abismo da paixão. Ali está o ser masculino, altivo, sem mesmo buscar a retribuição da beleza física como pequena paga à grandiosidade de seu sentimento.

Cara Laura. Espero ter clarificado para seus estudos, este nebuloso e difamante peso jogado sobre o comportamento idôneo e nobre do gênero masculino. Afinal, pode haver prova maior de nossa grandeza e desprendimento do que a capacidade de se dar integralmente a um, como a senhora mesmo se refere, "trubufu"?

Sempre a seu dispor para maiores esclarecimentos, o humilde servo de todas as mulheres

Severino


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17outubro1999
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