“Foi então que ele desapareceu. Exceto pela roupa que tinha no corpo e pelo dinheiro que levava na carteira, deixou tudo para trás…”
Foi o melhor livro que li em 2003. Continue lendo “O Livro das Ilusões [Paul Auster, 2002, Companhia das Letras]”
Desde 1998 que a gente escreve alguma coisa por aqui. Era um blog, mas não tinham inventado o nome ainda.
“Foi então que ele desapareceu. Exceto pela roupa que tinha no corpo e pelo dinheiro que levava na carteira, deixou tudo para trás…”
Foi o melhor livro que li em 2003. Continue lendo “O Livro das Ilusões [Paul Auster, 2002, Companhia das Letras]”
show de interpretações em filme instigante
É algo de diferente nas telas. O impacto é semelhante ao soco no estômago que Kids (1995) provocou. Este Thirteen é um pouco mais família e não trata da Aids, mas a excursão no mundo juvenil é arrepiante. Filmes instigantes, com baixo orçamento, temas atuais, tratando de comportamentos de uma época, com interpretações magníficas são bom caminho para estreantes brilharem. A diretora Catherine Hardwicke usou bem a fórmula, fez seu primeiro trabalho para a gente não esquecer e já começou sendo premiada no festejado Festival de Sundance. É fato que ela contou com duas ajudas fundamentais: as atuações magníficas de Holly Hunter e da menina (ela nasceu em 1987!) Evan Rachel Wood. Esta última tem uma performance de quem está possuída pelo personagem. Magra e alta, com 1,70 metros de altura, olhos azuis bons de câmera, a moça ocupa a tela todo o tempo e cava seu futuro promissor no cinema. Vamos vê-la muito por aí. Uma estrelinha de primeira grandeza.
Aos Treze (Thirteen) mostra, em ritmo acelerado, a transformação de Tracy (Evan Rachel Wood), uma menina introvertida e (como dizer?) normal, de família pobre de Los Angeles, chefiada por uma ex-alcoólatra separada que tenta sobreviver como cabeleireira enquanto administra um caso com um ex-drogado. Enfim, um lar típico. O desajuste da família e a pressão do rito de passagem da idade, onde o desejo de ser alguém, ser reconhecida e fazer parte de um grupo levam Tracy ao envolvimento com a doida e gostosona da escola, Evie Zamora (Nikki Reed). Ela torna-se sua mentora no processo de largar os ursinhos e partir para a vida de pequenos furtos e acesso a drogas em geral. Curiosidade: a história real da atriz que interpreta Evie, Nikki Reed, foi que inspirou o roteiro do filme. Nikki deve ter tido uma infância dureza. A personagem Evie é o próprio demo, o guia perfeito para quem quer se afundar no mundo do vale-qualquer-coisa para se obter os prazeres máximos de nossos dias, quais sejam: consumo, fama e drogas. Notem que sexo não entra na lista e aparece para teen Tracy como tarefas a serem cumpridas dentro do ritual de iniciação na adolescência.
Se investigarmos mais a fundo, o roteiro do filme não traz nenhuma mensagem especial. Mostra as armadilhas das transformações dos adolescentes: drogas que todos os jovens experimentam e a maioria consegue ultrapassar e o piercing, que afinal todo moleque usa hoje em dia, aparece com conotações masoquistas. Tudo mostrado com a câmera na mão, que dá o tom convenientemente nervoso a narrativa, mas que deve ter sido escolhido por ser a solução mais barata e ajustada para um orçamento de filme independente. Fica o interessante das situações limites que conhecemos ou ouvimos falar e que tememos que aconteçam com nossos filhos. A heroína Tracy embarca fundo na viagem de ficar grande. Para carregar mais as tinturas do personagem, a menina é histérica e anoréxica ou é histérica porque é anoréxica, não importa, com tendências autoflagelantes inteiramente afinadas com estes tempos de piercings e tatuagens. Isto pode justificar a forma acelerada e pouco crítica com que Tracy abraça a vida de roubar, se drogar e participar de qualquer festinha para ganhar status de alguém fora da multidão. O filme peca nas tintas fortes do roteiro. A natural sensação de que nossos filhos podem se envolver nestas ameaças, como drogas e roubo, são artifício eficiente para garantir a atenção de um mercado adulto que sai perplexo e aterrorizado com o mundo de perversão que ronda seus filhinhos na rua. O filme mostra como a “a juventude está perdida”. Infelizmente, a juventude, por definição, sempre está perdida.
O melhor do filme é a combinação da atriz antiga, Hunter, e a nova, Wood, como gerações diferentes mostrando competência. O esforço da mãe, tentando manter contato com a filha apesar de todos os condicionantes de sua vida miserável, é realista. A mãe Mellanie (Holly Hunter) convence pelo exibição de mais um caso de fracasso de comunicação onde ninguém é totalmente culpado ou inocente. A cena final do filme é uma convergência de emoções. Uma bela visão da leoa que lambe as feridas de sua cria. De novo, Holly Hunter deixa sua marca.
Pilatos é um excelente e oportuno lançamento editorial. Este livro de Carlos Heitor Cony, de 1974, merece ser reapresentado aos leitores. Acima de tudo, Pilatos destaca uma qualidade magistral do escritor: seu humor. Os personagens e as situações delirantes que Cony cria para eles são de se dobrar de rir. E digo dobrar, literalmente. Continue lendo “Pilatos [Carlos Heitor Cony, 2001, Companhia das Letras]”
prosa poesia de nossa colaboradora Eugenia Corazon Continue lendo “O Dia Amargo da Mulher”
De certa feita, no programa Manhattan Connection, Paulo Francis e Caio Blinder comentavam um filme que entrava no circuito. Caio Blinder, metódico, tecia algumas considerações equilibradas sobre o lançamento cinematográfico. Mal deixando que Blinder terminasse, Paulo Francis entrou desancando o filme e dizendo que aquilo era a mesma historinha de sempre. Paulo Francis, com seu jeito peculiar, nem tinha se ocupado em assistir ao filme. O detalhe foi apontado por Blinder, ao que Francis retrucou: – Não preciso ir ao cinema, já vi todos os filmes, essas histórias são sempre a mesma coisa!
A mesma história? Os roteiros se repetem? Continue lendo “A Jornada do Escritor – Estruturas Míticas para Contadores de Histórias e Roteiristas [Christopher Vogler, 1997, Ampersand Editora]”
a beleza dos contrastes
Assédio é uma história simples. Um roteiro linear, até monótono, que pode ser resumido em poucas palavras: “um europeu que se apaixona por uma refugiada africana cujo marido está preso em seu país”. O filme resultante não deveria impressionar. Talvez fosse atraente a um ou outro romântico para assistir na tevê por assinatura. Mas Assédio não corre este risco. É um Bertolucci. É um belo e envolvente filme do diretor de 1900, O céu que nos protege e Beleza Roubada. Mais uma vez, Bernardo Bertolucci é bem sucedido em roubar a beleza das emoções dos personagens e nos passá-la em primorosa embalagem.
O filme Assédio se constrói sobre os contrastes. A começar por colocar, numa mesma casa, a empregada africana que fugiu do país por motivos políticos, e um rico herdeiro europeu. Esta diferença de culturas é explorada por todo o filme. Das imagens ásperas da miserável África, somos levados a uma belíssima vila italiana onde Mr. Kinski (David Thewlis) consome preguiçosamente o tempo compondo e dando aulas de piano. Com esse contraste original dos personagens, a partir de uma repentina e direta declaração de amor, Bertolucci nos apresenta as mudanças na vida dessas duas criaturas. O paulatino empobrecimento de Mr. Kinski, a evolução de sua música, vão diminuindo a distância entre os personagens. Shandurai (Thandie Newton) passa eternos momentos tentando retirar a inexistente poeira das obras de arte que enchem a casa. Talvez tentando limpar permanente poeira que recobria sua vida na África. O processo do empenho dos bens materiais do ariano Mr. Kinski também é uma boa metáfora da dívida (ou culpa?) européia para com o vizinho continente negro. A idéia da redução da opulência da Europa para minorar o sofrimento terminal da África deve cutucar o europeu que vê o filme. Nós brasileiros, não temos este senso de diferença, convivemos permanentemente com os extremos de riqueza e miséria. Nossas culpas ficam por aqui mesmo, estão amortecidas, e vão, no máximo, até a favela mais próxima.
A bela mansão e o cotidiano de seus habitantes é explorada por certeira fotografia que bem se utiliza da arquitetura e dos fortes tons pastéis dos interiores. Som e fotografia quase se equiparam em importância nesse filme. Os diálogos pouco importam frente às expressões dos atores e à música. A música africana e a erudita são utilizados por Bertolucci para realçar as diferenças e a aproximação entre os personagens.
A atriz Thandie Newton é algo a parte dentro do filme. Sua beleza mestiça é realçada pelo fotógrafo com qualidade que se equipara a descoberta de Liv Tyler, em Beleza roubada. Quem assistiu Missão Impossível II, pode comparar como o pretenso charme do personagem de Thandie Newton no filme é ridículo frente às intensas imagens da bela Shandurai em Assédio. Mas, convenhamos, a especialidade de John Woo não é mostrar a beleza feminina.
O filme de 1998 só nos chega agora, mas já é um dos melhores lançamentos do ano 2000. É delicioso se entregar a leitura dos parágrafos de imagens criadas pelo italiano Bernardo Bertolucci, onde os detalhes proporcionam prazer como a leitura de um Machado de Assis, onde, todo o tempo, a história e o como ela é contada competem pela nossa atenção. Bertolucci brilha.
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