Homem do Ano Polemikos de 2003

Todo ano a gente reclama que está difícil escolher. Então, reclamemos de novo. O ano de 2003 foi atípico. Faltaram figuras de destaque no ano passado. Ou foi típico? Me interrogo se esta falta de novos personagens peculiares se deve à combinação da escassez de indivíduos de qualidade ou à vulgarização da calhordice. Por exemplo, quando o mestre da trambicagem jurídica surgiu na figura do Juiz Nicolau dos Santos Neto, foi um escândalo. Hoje em dia, os Rocha Mattos, no caso, vendedor de sentenças, e os Silveirinhas, este chefiando quadrilha de fiscais que controlavam a sonegação de imposto na Secretaria da Fazenda do Estado do Rio, aparecem com regularidade, nos deixando desinteressados da rotina de roubalheiras descobertas. Ou seja: ladroagem não chama atenção e não ganha nosso prêmio. Mas apareceram outros candidatos. O conceito de destaque varia muito, teve gente que votou no piloto Schumaker ou no personagem Seu Creysson, do Casseta. Seu Creysson tem o charme da idiotia brasileira, mas ainda é pouco para ganhar nossa honraria máxima anual. Tivemos um brasileiro de destaque no cenário mundial: o diplomata Sergio Vieira de Mello, funcionário de carreira da ONU, ferido e morto pela explosão de carro bomba no Iraque. Mas tudo não passou de um efeito colateral da doutrina Bush, que serviu para destacar o funcionário aplicado da ONU e quase canonizá-lo em rito sumário patrocinado pela mídia brasileira, sempre carente de ídolos.

Acho que ficaremos com o óbvio. Tivemos o Lula. Uma grande surpresa. Estrondoso anticlímax. Passamos 2002 pagando caro pelo dólar assustado com a chegada do Sapo Barbudo. Eis que o homem foi eleito e veio na forma do Príncipe do Mercado Financeiro: Lulinha I. Seu aliado Sarney (vejam só) já disse que ele deve ir para um segundo mandato: Lulinha II. O ex-operário se mostrou mais ortodoxo do que se esperava fosse José Serra, se eleito. Quem vendeu o dólar na alta e comprou ações, dobrou o capital em um ano, dá graças e acende vela pro Lula todo dia. Seu maior destaque entretanto foi, apesar de não melhorar nada para a população menos favorecida, ainda entrar 2004 com prestígio junto ao povão. O homem viaja, discursa, veste bonés, faz metáforas, e o povo desempregado, pagando juros acachapantes, ainda acha que o messias da esquerda vai fazer alguma coisa de surpreendente. O interessante é que ele e sua equipe, depois de empossados (claro que antes tudo estava errado e havia soluções novas que o PT iria apresentar) dizem que não há mágica, que o jeito é manter o plano do PSDB. A afirmação pode até ser considerada sensata, entretanto isso não é mais cara de pau, é cara de jacarandá lustrado.

No âmbito internacional, a Revista Time, num acesso de cretinice, escolheu os soldados americanos no Iraque como o Homem (ou homens) do Ano. Pergunto eu: os vivos ou os explodidos pelos iraquianos? Respeito o pudor da Time, mas a grande figura, foi o Bush mesmo. O ex-alcoólatra, ex-mau aluno, com cara de pouco afeito a raciocinar, com pouca paciência para leitura, é o imperador do planeta e esteve no topo da mídia durante todo 2003. Deu pancada nos iraquianos - já matou cerca de 10.000 deles - ao custo significativo de deixar morrerem 500 soldados americanos. Mesmo com essa fatura macabra para as famílias americanas, o medíocre presidente parece gozar da estima e consideração do eleitorado. É um artista. Oportunista que só ele, serviu peru de plástico no almoço de Ação de Graças para militares em solo iraquiano, lançou companha para enviar americanos a Marte (vai levar dezenas de anos, mas tem apelo junto aos eleitores adeptos de ficção científica), promoveu legislação para facilitar a entrada de mexicanos no país e, com isso, acariciou a boa fatia de eleitores que fala espanhol. Este Gengis Khan moderno está como o diabo gosta. Não explicou até hoje porque o Iraque tinha que ser invadido. Para fechar o ano, seu parceiro Saddam, ganhador de nosso laurel em 2002, chegou para dar uma ajuda na campanha presidencial do Bush, surgindo de um buraco para mostrar como o presidente americano é fodão. Pois é: Bush brilhou.

Para concluir o papo, decidimos por dividir o prêmio entre os líderes Lula e Bush. Ao que parece, o sucesso dos dois é exercício de fantasia. Bush engana o povo com uma aventura sem pé nem cabeça no Iraque. Nem mesmo o desejado petróleo vai cair tão cedo nas mãos dos americanos. Já o Lula vende esperança. Diz que o Brasil está arrumado, mas sabemos que é tudo frágil. Esta calmaria financeira não esconde nossas dívidas públicas, desemprego alto, juros estratosféricos, corrupção entranhada e sociedade se deteriorando. Pela farsa e pelos truques de ilusionismo dos dois políticos maiores nacional e internacionalmente, Lula e Bush levam o prêmio Homem Polemikos de 2003.

- Ernesto Friedman -

para conferir: 
Homem Polemikos de 2002   de 2001  de 2000   de 1999

Mulher Polemikos de 2002    de 2001  de 2000   de 1999


 
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25janeiro2004
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