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O grupo Planet Hemp não consegue ficar na quase clandestinidade de seu reduzido público. De vez em quando aparece um juiz buscando se exibir na mídia ou um prefeito querendo criar um factóide. Eles conseguem fazer com que o grupo de Marcelo D2 vá para as capas dos jornais. A maconha é a responsável. Os rapazes insistem em fazer músicas (se o que eles produzem é música é outra questão!) falando da Cannabis. Aí aparecem aqueles guardiões da sociedade para nos proteger. Interessante é que perante um assunto importante como o uso de drogas, os moleques do Planet Hemp parecem razoavelmente sãos quando comparados com os políticos e a Justiça de nosso país. O ponto de vista defendido pelo Planet – que cada um pode fazer o que quiser com seu corpo – é o mesmo defendido por John Stuar Mill, filósofo liberal inglês. É dele a famosa frase: “Sobre si mesmo, sobre seu corpo e mente, o indivíduo é soberano.”. Convenhamos que esta posição é mais razoável do que a do juiz que quer notoriedade ou o político que só está interessado em satisfazer seu eleitorado bíblia.
Mas, deixemos de mão estas questões menores ou mesquinhas. O fato é que a discussão das drogas é recorrente. A tendência mundial é para a lenta legalização, com o controle do uso e da qualidade das drogas. Um fato recente – e culturalmente relevante para o Brasil – é a posição de Portugal, que relaxou a legislação sobre a posse de drogas “leves”. O mesmo foi feito por outros países europeus e a Austrália. Na Califórnia, foi votada lei encaminhando para tratamento, ao invés de prender, pessoas que são pegas no primeiro ou segundo flagrante de uso de droga. Já no Brasil, continuamos imobilizados, sem uma discussão séria sobre a legalização.
Que fique claro, não estamos pregando a liberação. Esta não é boa solução, ainda que a repressão hipócrita e ineficiente que vigora hoje seja pior. Todos sabemos que é mais perigoso um jovem brasileiro ser achacado por um policial corrupto que quer lhe extorquir algum dinheiro do que o ato desse rapaz fumar um baseado. E como sempre, a corda parte do lado mais fraco. A exposição aos problemas da droga atinge mais a classe baixa, onde acontece o maior número de prisões por consumo e tráfico. Isto também é verdadeiro nos países ricos, mas, no Brasil, seu efeito é potencializado. Nossa população pobre, sem acesso à educação e emprego, está a mercê de embarcar no uso da droga como alternativa à crônica falta de opções. No caso mais grave, os jovens marginalizados são atraídos pelo tráfico. Não que seja uma grande opção de vida, o problema é a falta de outros caminhos a seguir. No Brasil subdesenvolvido qualquer problema é grave e tende a aumentar. Por exemplo, sem um mínimo de informação, o jovem brasileiro que vive nas ruas é presa fácil para uma droga fortemente viciante como o crack, que leva o rapaz a roubar e a menina a se prostituir para manterem o vício. Enquanto isso, nos EUA, a epidemia do crack já foi controlada.
A droga tem que ficar permanentemente na agenda dos debates importantes de nosso país. Seu reflexo sobre as frágeis instituições brasileiras é patente. Nossa polícia, com salários de US$300, não pode competir com a política salarial de uma indústria que se estima, por baixo, movimenta 150 bilhões de dólares anuais (um pouco menos que os 200 bilhões do cigarro e os 250 bilhões do álcool). Ficamos com a dúvida: o governo vai controlar o tráfico, ou o contrário, os traficantes vão controlar o governo? Isto não é fantasia. A Colômbia já experimenta hoje esta situação. Perante um tema dessa gravidade, temos a chance de presenciar grandes retrocessos. No Brasil, um candidato à presidência da república, como Garotinho, com discurso voltado para as igrejas evangélicas, certamente tratará as drogas na versão simplista de “coisa do demônio”. Imaginem o perigo dessa abordagem para um problema com esta complexidade. Para você, leitor esclarecido, um teste rápido: qual das drogas tem maior poder de criar dependência: nicotina ou heroína? Dá para imaginar, não é? A primeira! Entretanto, a segunda, por envolver seringas e agulhas, tem efeito também na difusão da Aids, o que aumenta o estrago que produz na sociedade. Ou seja, muitos aspectos devem ser considerados para tratar o problema. A mediocridade política brasileira combinada com nossa cidadania entorpecida não parecem estar preparadas para isso. Simplificar a discussão é a melhor maneira de perpetuar seus males e perder o controle sobre o problema. As drogas estão mais baratas, o que mostra a eficiência da indústria do tráfico e a fome do mercado por este produto. Vários países estão se movimentando no sentido de controlar seu uso, permitindo proteger crianças, tratar dependentes crônicos e definir padrões de qualidade das substâncias.
A legalização pode limitar o consumo de drogas conforme seus efeitos e necessidade de controle. Poderá reduzir o devastador efeito sobre nossas frágeis instituições como a polícia e Congresso. Temos decisões a tomar. Talvez a maconha possa vir a ser comercializada, no futuro, pela Souza Cruz. Talvez a cocaína tenha que ser vendida em farmácias. A lei contra dirigir drogado, seja alcoolizado ou abobalhado por um baseado, tenha que ser mais rigorosa. A publicidade sobre a maconha deverá ser proibida. Deverão ser proibidos anúncios associando a marijuana aos coqueiros da Jamaica. Seja o que for, temos que nos mover dessa perplexidade passiva frente ao problema. Precisamos agir. E que seja logo!
(alguns dados dessa matéria retirados de www.economist.com)