O Valor do Amanhã [Eduardo Gianetti, 2005, Companhia das Letras]


Durante a vida humana, somos expostos a tomar infinitas decisões, muitas delas se encaixam no problema de escolher entre desfrutar algo hoje ou esperar para saboreá-lo amanhã. Este problema, inerente ao transcorrer da vida na linha do tempo, é abordado com profundidade e elegância no livro O Valor do Amanhã, do economista e filósofo Eduardo Gianetti. Continue lendo “O Valor do Amanhã [Eduardo Gianetti, 2005, Companhia das Letras]”

Garota de Ouro [Million Dollar Baby] de Clint Eastwood

garota de ouro, foto imdb.com

clint eastwood embarca na pieguice

O cinema americano desandou. Fiquei estupefato com o filme de Clint Eastwood. O eterno mocinho do faroeste espaguete sabe muito de cinema. Ele não veio para inventar, mas suas obras, com particular destaque para Imperdoáveis (Unforgiven), mostram que o homem entende do ofício e está bem posicionado como produtor e diretor de filmes – como dizer? – arrumados. Pois é, a idade bateu. O velho Clint dá sinais de caducar. Seu filme Garota de Ouro (Million Dollar Baby) é quase ruim. É um show de pieguice e lugares comuns sentimentais em filme pré-fabricado para atender aos critérios da disputa pelo Oscar. Clint abusa das fórmulas para fazer filme para o povão americano, apelando de todo jeito. Dessa vez ele radicalizou. Se filme mostrando sagas de vencedores faz sucesso, se filmes tratando de deficientes físicos toca o coração e a carteira do público, por que não juntar as duas coisas? O diretor faz isso com uma mão tão pesada que chega a dar constrangimento em quem tiver um mínimo de senso crítico e não se entregar às armadilhas vulgares que ele utiliza para extrair lágrimas da platéia. Os sintomas do golpe engendrado pelo ambicioso diretor são óbvios. Ele cria um trio de alta receptividade para as platéias. Um é o próprio Clint Eastwood, atuando bem como o treinador Frankie Dunn, cheio de culpas com a filha – ou seria um diretor de cinema cheio de culpa com o produto do seu trabalho? – que encontra a filha que todo pai queria ter. Tem também o sempre correto Morgan Freeman, como o coadjuvante que amarra as situações e faz a história andar. E tem a menina de ouro, Hilary Swank, fazendo a lutadora de boxe Maggie Fitzgerald, que é o melhor do filme. Swank tem uma beleza estranha, às vezes rude, às vezes terna, e defende seu pesado personagem com garra extraordinária, tornando-o minimamente assistível. A atriz é realmente uma força da natureza. Lembram de Meninos Não Choram (Boys Don’t Cry), onde Swank é um menino? Seu rosto anguloso lhe deu agora os recursos necessários para encarar o papel de boxeadora. A atriz não baixa a guarda em nenhum momento da interpretação. Já levou o Globo de Ouro de Melhor Atriz de Drama. Swank põe na sombra até Morgan Freeman, que não é bobo e soube se colocar no canto do ringue, garantindo o brilho como coadjuvante.

E a história? Se você está com problemas e quer se entregar à terapia da emoção e choro livre, vá fundo. Conforme o filme se encaminha pro final, Clint Eastwood, arrebenta a boca do balão e mergulha na tragédia. Ele simplifica o mundo e produz falhas graves de aderência à realidade. Passa por cima da lógica, talvez por falta de tempo, produz um final de filme que oscila entre o seríssimo e o ridiculamente sentimental. Mas o que está valendo é jogar a emoção da platéia na lona e obter os votos da Academia do Hollywood. Este é o jogo sujo do diretor. Ele pode ver o público americano como um bando de espectadores embotados que precisam de doses cavalares de adrenalina para sair do coma de um povo que elegeu Bush por uma segunda vez. Mas, para alguém semidesperto, a presepada pomposa do filme é torturante. Tirando o trio ternura central, o resto dos personagens são um desfile de caricaturas. A cena do hospital, com a família gulosa da lutadora, é constrangimento para se ruborizar e virar o rosto. A musiquinha de fundo, feita para dar o tom da lágrima que corre, vira o estômago. Resumindo, é pura apelação.

Para não dizer que não há mais nada a se falar sobre o filme, ainda há comentário negativo a ser feito. O treinador passa a sua pupila a preocupação com “se proteger todo o tempo”. Isto é parte central do enredo. Esta ênfase em se proteger parece coisa liminar ou subliminar do medo americano de hoje. Eles estão certos que se descuidarem e olharem pro lado, qualquer subdesenvolvido pode violar uma regra e fazer uma bomba nuclear. Sei não. Essa mensagem do filme pode ser produto da mediocridade de visão do mundo que a sociedade americana tem hoje, pode ser minha paranóia intelectualizada ou pode ser o Alzheimer que chega para Eastwood.

[Ernesto Friedman]
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Quem escondeu os juros?

Há uma coluna da Veja que é meio chata. Quem escreve é Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central. Ele fala de assuntos enfadonhos da Economia, que não devem atrair muitos leitores da frugal revista semanal brasileira. Entretanto, em artigo recente, intitulado “Onde estão os juros?”, Gustavo tratou de um tema tabu, que em geral é menosprezado ou premeditadamente retirado das pautas. Trata-se dos crediários compulsórios que os brasileiros são obrigados a usar em suas compras. Continue lendo “Quem escondeu os juros?”

Mulher do Ano Polemikos 2003

será a Benedita?

Antes que o ano 2004 acabe temos que escolher a Antes que o ano 2004 acabe temos que escolher a Mulher Polemikos 2003. Sejamos metódicos. Excluímos as bundas e rostos bonitos, procedimento este que restringe radicalmente a pesquisa. No meio empresarial não vimos destaque. Na área de atuação social, Dona Zilda Arns apareceu muito na mídia que resolveu descobrir seu trabalho de toda a vida, já reconhecido aqui e lá fora. A solidez e a dedicação de mais esse Arns, fundadora e coordenadora da Pastoral da Criança, que atua em mais de 1.500 projetos na área de saúde e educação, a qualificam para ser a mulher de destaque de 2003 para Polemikos. Mas não nos precipitemos … Continue lendo “Mulher do Ano Polemikos 2003”

O Homem dos Dados [Luke Rhinehart, 1994, Imago]

O Homem dos Dados é uma comédia escrita em tom autobiográfico, que conta a história de um psicanalista que inventa o jogo de rolar os dados para escolher como ele deve agir a cada momento ou que personalidade interpretar por determinado espaço de tempo. Continue lendo “O Homem dos Dados [Luke Rhinehart, 1994, Imago]”

O Papa Ataca Os Veados

A competição é a alma do negócio! Não é bem isso. A competição é que chegou ao negócio das almas. Criptográfico? Talvez, um pouco. Explicando: as religiões estão competindo acirradamente pelos clientes, digo, pelos fiéis. Mas, é a mesma coisa, não? Os intermediários de Deus lutam sua cruzada de marketing para obterem os fregueses aflitos que vão soltar a grana na fim do culto. As Igrejas Universais e suas correlatas genéricas saíram na frente vendendo milagres a curto prazo, desbancando a Igreja Católica, que também gosta de grana, mas vende o paraíso depois da morte. A Santa Madre Igreja funciona no mercado de longo prazo, faturando alto com as heranças deixadas para o Vaticano e seus franchises, perdão, paróquias. Mas, o mercado se estreita e as empresas têm que ser ousadas. A Igreja Católica têm um diretor de marketing que merecia passar por umas sessões de tortura da Santa Inquisição. Será que foi ele que recomendou ao CEO do Vaticano (me refiro ao Papa) que seria de bom tom dar uma coça nos homossexuais? Mas o fato é que a Igreja, recentemente, caiu de pau nos pobres gays (e nos ricos tmbém). Voltou a conversa de que veadagem é doença, é coisa do demônio, aquele discurso demente com 2000 anos de idade. Eu não sei não. Pode até ser que os carolas e os enrustidos (são mais ou menos a mesma coisa, né?) se excitem com a caça às bruxas e bruxos. Tá bem que os gays não são o melhor mercado para propalar a castidade, o coito interrompido e a trepada mensal regida pela tabelinha. A jogada pode ser: já que não posso catequizá-los, vamos perseguí-los. Os homossexuais podem estar sendo usados para tirar mais grana dos beatos. Esse dinheiro será, então, canalizado para pagar os processos abertos pelos pais dos meninos que foram abusados pelos padres pedófilos de Boston. Vai rolar muito milhão de dólar da Santa Sé para encobrir este “pequeno” deslize dos padres tarados da cidade. Por sinal, nesta cidade americana, está dura a competição entre os vendedores de prendas divinos. A The Old South Church de Boston criou o receptivo The Lesbians, Gays and Friends Fellowship que congrega a turma alternativa da cidade. Intervalo no discursos irado: “esta antiga Igreja, fundada em 1669, têm uma prática liberal e advoga os direitos dos gays desde de 1972”. Volta a ira: É bom ver que há um racha no discurso furibundo das Igrejas contra o homossexuais. Apesar do quê, registre-se, é uma tradição da Igreja Católica se amarrar às causas furadas. Ela é contra a camisinha, contra o aborto, contra o planejamento familiar. Há coerência nos erros. Tem gente que vê virtude nessa coerência. Eu vejo apenas babaquice.